terça-feira, 30 de setembro de 2008

Pode um desenho criado em 1950 ser atual?





Eu digo que sim. E logo você vai entender o porquê. Estou falando do famigerado Snoopy, aquele fofinho, bonitinho; o cachorro que se porta como humano.
Peanuts (nome da HQ em inglês) foi criado em 1950 por Charles Monroe Schulz. Snoopy, o cachorro de estimação de Charlie Brown tem o complexo de Walter Mitty, personagem criado pelo norte americano James Thurber. Mitty é retraído, mas extremamente capaz de imaginar coisas, como por exemplo, que é piloto de guerra, cirurgião, assassino. As semelhaças são meras coincidências...
Charles Schulz fez tanto sucesso que esta é a tirinha com mais tempo de vida. Foram 50 anos de quadrinhos inéditos em 2,6 mil jornais, 75 países e 4o línguas. Alguns jornais continuam publicando as HQs e a editora L&PM publica todo semestre um número novo no Brasil, ao todo já foram 6 pocket books, o último foi "Como você é azarado, Charlie Brown!". Uma prova de que continua atual...
Schulz deixa seus trabalhos com os quadrinhos em dezembro de 1999, devido a um câncer e morre em fevereiro de 2000, com 88 anos.
As tirinhas, que passaram e resistiram por gerações, traz uma filosofia própria. As crianças têm comportamentos, sentimentos e situações de adulto. É evidente essa característica quando acompanhamos as situações vividas por Charlie Brown. O garoto da cabeça redonda se sente frustrado, preocupado, ansioso, decepcionado... sofre por amor, por rejeição e às vezes por solidão.
Álvaro de Moya, maior especialista de quadrinhos no Brasil (com quem tive o prazer de conversar a respeito dos Peanuts), escreve em seu livro "Shazam!" que Charles Schulz pode ser considerado o "Freud dos quadrinhos" e que "Charlie Brown é a síntese de todos os complexos de todos os homens, adquiridos na infância". Fala também que em Peanuts, "o mundo é retratado com agudeza através das crianças. (...) Schulz usa uma linguagem com grande dignidade literária, colocando na boca de seus personagens frases surpreendentemente adultas ou mesmo pensamentos profundos num cãozinho."
Considerada como cultura de massa, as histórias em quadrinhos também são tema da obra "Apocalípticos e Integrados" de Umberto Eco. Mostrando as diferenças dos produtos da cultura de massa, Eco defende Charles Schulz colocando sua obra como um clássico. Para ele, "As crianças de Schulz não são instrumento para contrabandear os nossos problemas de adultos; esses problemas são nelas vividos segundo os modos de uma psicologia infantil, e justamente por isso nos parecem tocantes e sem esperança, como se de repente reconhecessemos que os nossos males poluíram tudo, na raiz." E não esconde sua admiração: "Peanuts fascinam com igual intensidade os grandes mais sofisticados e as crianças, como se cada um aí encontrasse algo para si, e é sempre a mesma coisa, fruível em duas chaves diversas."
Moya e Eco têm razão! Tanto que as tirinhas foram instrumento do terapeuta norte americano, Abraham J. Twerski, para curar um paciente alcoólatra. Ele conta seu processo e monta guias "auto-ajuda" com as HQs no livro "When do the good things start?" e "Waking up just in time".
Eu poderia continuar escrevendo e escrevendo sobre os outros personagens e suas adoráveis lições, mas deixo para um próximo post.
Snoopy e sua turma viraram um clássico, uma referência, um modo de ver a vida... e tão completo que sobrevive com o passar do tempo, como se tudo que está contido ali pudesse ser vivido hoje por cada um de nós. Vale a pena dar uma lida com outros olhos e esquecer um pouco o cachorrinho fofinho...

P.S.: O quadrinho colorido lá em cima foi a última tirinha criada por Schulz, em forma de despedida...

Um comentário:

Julianna Santos disse...

Nossa Li, adorei saber mais sobre o Snoop, ver que ele tem uma história muito mair das que são apresentadas nos quadrinhos!!!